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Um mês de governo Temer: 5 fatos e 5 dúvidas





Primeiro mês de Temer deixou algumas coisas bem claras - outras, nem tanto.

Foto: Reprodução / BBC

Quando o Senado decidiu processar e, com isso, afastar temporariamente a presidente Dilma Rousseff, em 12 de maio, o vice Michel Temer assumiu o cargo defendendo um governo de "salvação nacional".

Em seu primeiro discurso, no mesmo dia, o presidente interino prometeu, por exemplo, estimular o ambiente de negócios para combater a crise, promover reformas como a da Previdência e proteger a operação Lava Jato de interesses políticos.

Passado um mês, a BBC Brasil levantou cinco fatos e cinco dúvidas sobre a nova administração:

O QUE É FATO

1) Bom relacionamento com o Congresso

O apoio dos parlamentares, que afastaram Dilma, foi essencial para a chegada de Temer ao poder.

Político experiente e ex-presidente da Câmara, em um mês ele conseguiu vitórias importantes, como a aprovação da redução da meta fiscal, autorizando o governo a concluir o ano com um déficit recorde de R$ 170,5 bilhões.

A aprovação era considerada fundamental para fechar as contas sem cortar investimentos e programas sociais.

Além disso, a Câmara aprovou a prorrogação até 2023 da DRU, dispositivo que autoriza a União a utilizar como quiser 30% da arrecadação.

Para o cientista político Nuno Coimbra, pesquisador da USP, essas conquistas mostram uma relação com parlamentares muito melhor que a de Dilma ─ o que não necessariamente levará a resultados positivos para governo e país.

"Temer ainda está pagando o apoio que recebeu para chegar ao poder. Temos de ver se haverá uma contrapartida deles passando as outras agendas econômicas que o governo quer."

2) Menor diversidade no gabinete

Foi a primeira vez desde 1979 que apenas homens formam o gabinete de ministros.

Diante das duras críticas, Temer nomeou mulheres para cargos como o de presidente do BNDES ─ ocupado pela economista Maria Silvia Bastos Marques.

O interino teve dificuldade, porém, para encontrar uma auxiliar para assumir a então Secretaria de Cultura, que ficaria subordinada à Educação. Após pelo menos cinco recusas, escolheu o diplomata Marcelo Calero ─ que foi promovido a ministro com a recriação da pasta.

3) Governo 'sem medo' de recuar

Algumas idas e vindas marcaram esse primeiro mês, entre elas a decisão de recriar o Ministério da Cultura. O recuo ocorreu após protestos de artistas em todo o país contra a extinção da pasta.
Falas de ministros também tiveram de ser "corrigidas".

Primeiro, Alexandre de Moraes (Justiça) disse em entrevista que iria sugerir a Temer que colocasse fim à tradição de escolher o primeiro colocado da lista tríplice votada pelo Ministério Público para comandar a Procuradoria-Geral da República ─ praxe adotada nos governos anteriores.

Após reações negativas, Temer afirmou que continuará indicando o nome mais votado.

Em outro caso que se tornou célebre, o ministro da Saúde, Ricardo Barros, afirmou que o tamanho do SUS precisaria ser revisto. Diante da reação negativa, ele próprio recuou e negou planos nesse sentido.

4) Mudança de rumo na política externa

Ao tomar posse, o ministro José Serra (Relações Exteriores) disse que o Itamaraty não defenderia mais o que ele chamou de "interesses de um partido" ─ em referência aos anos petistas ─ e destacou o objetivo de aumentar o intercâmbio comercial com "parceiros tradicionais" como Japão, EUA e União Europeia.

Além disso, a pasta adotou um tom mais duro ao responder a países como Venezuela, Cuba, Bolívia e Nicarágua, que atacaram o processo de impeachment. Em comunicados oficiais, o Itamaraty usou termos como "falsidade", "preconceitos" e "absurdo" para classificar a opinião dos vizinhos.

A jornalistas, Serra negou que esteja partidarizando a condução da política externa.

5) Equipe econômica forte

"Queridinho" dos empresários e "fiador" do então presidente Lula junto ao mercado, o ministro Henrique Meirelles se tornou um dos nomes mais fortes do gabinete de Temer, dando também um peso maior à Fazenda ─ um contraponto aos anos de Dilma, que, segundo analistas, era quem realmente dava todas as cartas na economia.

Meirelles assumiu com três eixos de medidas na cabeça: fixar o teto para o crescimento dos gastos públicos, reformar o sistema previdenciário e racionalizar o sistema tributário.

O professor Rogério Mori, da FGV-SP, lembra que nomes fortes também foram escolhidos para comandar BNDES, Banco Central e Petrobras.

"A impressão que ficou é que havia um rombo muito grande do governo anterior, e que agora os problemas estão sendo dimensionados", disse.

O QUE É DÚVIDA

1) Apoio à Lava Jato e ao combate à corrupção

Em seu primeiro discurso, Temer afirmou que daria proteção "contra qualquer tentativa" de enfraquecer a Operação Lava Jato, que investiga o esquema de corrupção na Petrobras.

Duas semanas depois, porém, vieram à tona gravações de conversas entre o (agora ex) ministro Romero Jucá (Planejamento), um de seus aliados mais próximos, e o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado. Nelas, Jucá sugere que a mudança de governo poderia "estancar a sangria" representada pela operação.

A notícia colocou em xeque o compromisso do governo com o combate à corrupção, incerteza que cresceu com a queda do ministro Fabiano Silveira (Transparência, Fiscalização e Controle), ocorrida após a divulgação de áudios em que ele critica a Lava Jato e orienta o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), e Machado sobre como se portar em interrogatórios.

Além disso, muitos questionam o fim da CGU (Controladoria-Geral da União), agora englobada pela pasta que Silveira comandava.

2) Efetividade de medidas de combate à violência contra a mulher

Depois do estupro coletivo de uma adolescente no Rio, o governo anunciou ações como a criação de um núcleo federal de enfrentamento à violência de gênero e a padronização de um protocolo de atendimento às mulheres.

As iniciativas, no entanto, não têm prazo para serem executadas e não possuem metas. Para críticos, seria um pacote "vazio".

Responsável pelo anúncio do plano, o ministro da Justiça não detalhou quanto ele custará.

3) Pacote de austeridade

Nos discursos da equipe econômica e de Temer, um assunto é quase onipresente: a necessidade de cortar gastos, controlar a dívida pública e diminuir o déficit primário do país.

Nesta sexta, por exemplo, o governo anunciou o corte de 4,3 mil cargos comissionados e transformou 10 mil cargos em concursados, defendendo que isso economizará R$ 230 milhões anuais.

Mas suas principais medidas ainda são dúvida, entre elas a Reforma da Previdência (veja abaixo) e a adoção de um teto para os gastos públicos ─ segundo o qual o percentual de crescimento dos gastos em um ano não ultrapassaria a inflação do anterior.

A aprovação da proposta pelo Congresso pode ser difícil ─ líderes dos maiores partidos nas Casas não querem se comprometer com ela nos termos do governo. O projeto mexeria nos gastos com saúde e educação, o que, por ser altamente impopular, enfrenta resistência.

Mori, da FGV, diz que a aprovação vai depender da capacidade de negociação.

"Temer tem uma vantagem infinitamente maior do que Dilma e Lula, porque conhece o que acontece na cabeça dos parlamentares, entende o jogo. Ao mesmo tempo, tem uma série de fragilidades e não possui respaldo popular, porque não foi eleito. É uma situação complexa."

4) Reforma da Previdência

Tida como prioridade para melhorar as contas públicas, uma Reforma da Previdência é discutida há décadas ─ o objetivo seria corrigir o desequilíbrio entre o que se gasta com pensões e o que se arrecada com impostos.

Meirelles afirmou que um grupo de trabalho foi criado para discuti-la. Centrais sindicais e parte dos parlamentares, porém, são refratários a ideias como criar uma idade mínima para aposentadoria, defendida pelo ministro.

Há dúvidas até se os líderes do PMDB de Temer darão apoio total à ideia, dado seu potencial impopular.

5) Temer fica até 2018?

A dúvida mais crucial é se Temer continuará na presidência até o fim de 2018, ano das próximas eleições presidenciais.

Um dos pontos que alguns senadores têm discutido é a possibilidade de mudar seu voto no julgamento final sobre o impeachment de Dilma, que vem acenando com uma proposta de plebiscito para consultar a população sobre novas eleições.

O cientista político Nuno Coimbra avalia, porém, que chances da petista voltar são remotas, dada a inexistência de diálogo dela com os parlamentares e sua impopularidade.

Com Temer, diz Coimbra, os congressistas têm maior margem de manobra para negociar cargos e interesses.

Mas o peemedebista também tem um problema no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), que analisa as contas de 2014 da chapa Dilma-Temer, acusada de receber recursos do esquema de corrupção na Petrobras.

Há a possibilidade de ambos serem cassados, embora Temer já tenha pedido que seu caso seja analisado separadamente - ele diz que não pode ser julgado por atos atribuídos a Dilma e ao PT.

A decisão final, porém, pode demorar: o presidente do TSE, Gilmar Mendes, já declarou que o julgamento dificilmente ocorrerá ainda neste ano.
Redação

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